sábado, 25 de junho de 2016

COGNAC!...

"Que poeta que sou com teu auxílio!  Somente um trago teu m’inspira um verso;  O copo cheio o mais sonoro canto;  Todo o frasco um poema!"



De caráter nobre, quase aristocrático, o Cognac  tem sua imagem associada ao bom viver e à sofisticação do  gosto. Diz-se que, quando se adquire uma garrafa de um bom Cognac, não se compra uma bebida, mas um momento único. Machado de Assis o chama de "inspirador de ledos sonhos", de "excitante licor de amor ardente", e afirma "valer mais um trago teu que mil grandezas".
O clichê do Cognac apreciado numa noite fria em frente à lareira, acompanhado de charutos, continua valendo. A lareira é opcional (ou é o próprio Cognac) e atrás dos charutos não estão mais apenas homens. As mulheres tem aderido ao Cognac da mesma forma que adotaram os charutos, escolhendo os de paladar mais delicado.

Chamado por Victor Hugo de "elixir dos deuses", o cognac, desde 1909, só pode usar o termo em seus rótulos se feito com uvas Ugni-blancs cultivadas, fermentadas e destiladas na região de Cognac, na França, em alambiques de cobre e envelhecido em barris de carvalho. Fora dessa região, qualquer destilado de vinho envelhecido em madeira é chamado de brandy.  Assim, todo Cognac é um brandy mas nem todo brandy é um Cognac. Entendeu? Continuemos.

Sua origem parece ter se dado na França, por volta do século XII, quando navios holandeses e ingleses, carregados de sal, começaram a encher as embarcações com vinhos para a viagem de volta. Esses vinhos, de vida curta, não aguentavam o longo período em alto mar e estragavam no meio do caminho. Concluiu-se que antes de embarcar, melhor seria destilar o produto para, depois, já em seu destino, diluí-lo em água e, acreditavam, recriar o vinho. Com a destilação, o volume de carga diminuiu consideravelmente e aumentou sua durabilidade. Porém,guardado em barris de carvalho para seguir viagem, notou-se que a bebida melhorava ao paladar, tornando-se agradável para ser bebida pura. Temos assim os primeiros barris do, ainda primitivo, Cognac.

Ainda no século XII, o Cognac foi melhorado após a descoberta da destilação dupla. Conta a lenda, - eu gosto mais dessa versão, mais romantizada, menos complicada -, que o segredo da dupla destilação foi revelado pelo cavaleiro Jacques de la Croix-Maron, durante um pesadelo: Satanás, desejando a alma do Cognac, tentou fervê-lo sem sucesso. Quando o demônio ameaçou fervê-lo novamente, o cavaleiro acordou repentinamente e convenceu-se de que, destilando seu vinho pela segunda vez, a qualidade da aguardente melhoraria em relação a primeira ebulição. Assim fez, e assim constatou.

Histórias à parte, depois de destilado, o eau de vie  precisa passar vários anos, às vezes décadas, guardado em barris de carvalho a fim de desenvolver suas qualidades, reduzir seu teor alcoólico e adquirir sua característica cor âmbar. É também nessa fase que recebe o gosto peculiar concedido pela madeira.

Durante esse período, o Cognac perde de 3 a 4% de seu volume alcoólico, por ano. Conhecida como "a parte dos anjos" , essa  perda é necessária para a maturação do processo.

As referências quanto a idade do Cognac correspondem ao tempo que  passou envelhecendo no barril, já que na garrafa sua evolução cessa, tornando-o imortal.

Maisons reputadas costumam trabalhar com aguardentes antiquíssimas, chegando algumas a ter quase um século de hibernação. Nessas casas, blends de uvas de quarenta a 100 anos flutuam em barris de carvalho, pronunciando aromas complexos de frutas secas, bálsamos e especiarias. Tanto capricho e cuidado, lógico, tem seu preço.

Tesouro líquido - sem exagero na expressão - o  Cognac  Louis XIII Black Pearl Limited Edition, da Maison Rémy Martyn - cujo décanteur (como é chamada sua garrafa exclusiva) é minuciosamente esculpido e feito com um precioso cristal francês, com gargalo em ouro 24 quilates e tampa em formato de flor de lis -, pode chegar a custar tranquilamente  US$30.000,00.
Não atoa, os principais consumidores de Cognac finos estão nos países do Oriente Médio, onde as caríssimas  garrafas de cristal Baccarat passam de mãos em mãos de xeiques e príncipes muito abonados.

Como os franceses, prefiro degustar o Cognac aquecendo-o antes com o calor da palma da mão envolta naquele copo baixinho, bojudo. Degustadores contemporâneos dirão achar ideal bebê-lo em temperatura ambiente, usando cálices com hastes compridas. Não ligo, o importante é manter o ritual e cultivar o tempo da degustação, como os bons produtores o fazem para chegar à bebida final. A diferença é que, em vez de décadas, basta esperar alguns minutos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário