quarta-feira, 3 de agosto de 2016

CAPONATA SICILIANA

Já parou pra pensar na infinidade de preparados para se fazer com berinjelas? Ensopada, braseada, assada, grelhada, frita...sem exageros, seria capaz de postar toda semana uma receita nova aqui no portal sem repetir por muito, muito tempo.

Natural do velho mundo é bem provável que uma ancestral dessa hortaliça, de casca reluzente e belas curvas, tenha flutuado mar afora da Africa até a Índia onde, domesticada, é até hoje apreciada como condimento ou guarnição aromática.

Mercadores árabes à levaram para a Espanha e ao norte da África durante a Idade Média. Na França teria chegado por volta do século XVIII.

Ao desembarcar na Itália no século XV, foi acusada de planta venenosa e seu consumo deixaria as pessoas loucas, insanas - não estavam de tudo errados, ficamos loucos por um prato de Ratatouille, não é?

No Brasil adaptou-se tão bem que se tornou coisa nossa. A usamos a exaustão em preparados rápidos do dia a dia e em pratos clássicos como o babaganoush, à la parmigiana e a mussacá grega.

Há berinjelas de várias cores e tamanhos, com sabor muito suave ou intensamente amarga. Porém todas as variedades possuem interior esponjoso, com muitas pequenas bolsas de ar entre as células. Quando cozidas as bolsas se esvaziam e a polpa se consolida numa massa de textura fina, às vezes cremosa, às vezes carnosas, tudo depende da variedade e do tipo de preparação.

Representante da comida mediterrânea vegetariana, admirável por seus aromas e texturas carnosas, a caponata - que tem a berinjela como ingrediente principal - é um famoso antepasto do sul da Itália, que se come quente ou frio, como acompanhamento ou entrada. Orgulho dos sicilianos, este prato se torna especial quando preparado com berinjelas jovens e bem firmes , tomates italianos maduros bem vermelhos e um  vinagre de excelente qualidade.

De preparo rápido ,  sempre a faço em casa para acompanhar fatias grossas de pães italiano transformando-a em irresistíveis bruschettas.

Vamos pra cozinha?
Antes, abro uma garrafa de um bom pinot-noir da Borgonha. Não para a receita, mas, para a plateia  e para o cozinheiro. Capricho ou não, acho que esse preparado permite um momento enófilo,  e uma taça de um sedoso e macio vinho francês (nada contra os fermentados italianos),  enquanto se prepara a receita, aguça os sentidos, torna a situação especial. Experimente, fica mais gostoso.

Começo a receita.
Salteio pedaços grandes de 2 berinjelas ( se cortar pedaços pequenos não poderá apreciar seu adorável sabor e textura cremosa), numa panela grande com um de azeite.

Adiciono um punhado de orégano, sal e pimenta do reino. Agito até  que a mistura esteja coberta pelo azeite. Cozinho por mais ou menos 5 minutos, sacudindo vez ou outra, até a berinjela começar a dourar.

Acrescento à mistura, meia cebola roxa picada finamente, talos picados de um maço de salsinha e dois dentes de alhos cortados bem fininhos. Salteio  e cozinho por mais alguns minutos.

Fico a vontade para por mais azeite se percebo que a berinjela está ficando seca.

Junto ao salteado 2 colheres sopa de alcaparras lavadas  e um punhado generoso de azeitonas verdes inteiras sem caroço. Borrifo com vinagre de maçã.

Quando o vinagre tiver evaporado, acrescento 5 tomates italianos picados grosseiramente.

Cozinho por quinze minutos ou até que fiquem tenros. Provo, se necessário corrijo com um pouco mais de sal, pimenta e vinagre.

Retiro do fogo e espalho sobre a caponata quente, salsinha picada e um pouco de passas brancas.

Finalizo polvilhando meu preparado com amêndoas em lâminas e azeite.

Abro outro pinot-noir.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

CROQUE-MONSIEUR

De origem controversa, o mais famoso sanduíche Francês (uma espécie de misto quente alinhado ) já era servido por volta de 1910 nos bistrôs parisienses. Segundo a Enciclopédia Larousse Gastronomique, o primeiro Croque-monsieur teria sido servido no verão daquele ano, num restaurante chamado Le Trou dans le Mur, em Paris.
Uma possível versão melhorada do Welsh Rarebit inglês, o Croque-monsieur é ótima opção para uma refeição rápida e leve.  Charmoso, harmoniza bem com um bom pinot-noir - francês claro.

Delicioso ver a personagem de Maryl Streep, no filme Simplesmente Complicado,  preparando  de forma descontraída o sanduíche para um charmoso arquiteto,  enquanto seu ex-marido os espia pela janela da casa. Ótimo filme, ótima cena.

Por aqui, gosto de prepará-lo aos sábados, no almoço, para meus filhos e amigos. Companhias muito boas para perder tempo no fogão.

O Croque-monsieur clássico é feito com presunto e queijo entre duas fatias de brioche, coberto com molho bechamel e mais queijo ralado por cima para gratinar. Abelhudo que sou,  gosto de incrementar: substituo o presunto cozido por fatias de presunto de Parma, e o queijo Emmenthal por Gruyere. Dispenso também o brioche, acho muito doce, macio e difícil de encontrar no formato de pão de forma.  Prefiro assar meu próprio pão de casca fina, crocante e miolo macio, que leva na massa queijo gruyere com um toque de cominho. Fica perfeito (semana que vem escrevo mais sobre esse ele).

Rápido e fácil, o bechamel também é fabricado aqui em casa.

Derreto 50 gr de manteiga sem sal numa caçarola em fogo médio, acrescento peso igual de farinha, cozinho a mistura até  ficar num tom marfim. Acrescento 1 litro de leite frio. Mexo insistentemente com o fuet até dissolver  a mistura de manteiga e farinha (roux). Abaixo o fogo. Junto metade de uma  cebola espetada com 3 cravos, 2 folhas de louro e noz moscada ralada. Não coloco sal. Por ser um molho mãe (base pra outros molhos),  prefiro não salgá-lo. Deixo o sal para quando for usar na preparação escolhida.  Espero encorpar, mexendo vez ou outra.  Desligo fogo. Se necessário passo pela peneira. Deixo esfriar. Guardo na geladeira.

Já temos o pão, o bechamel, o queijo e o Parma. Hora de montar o almoço.

Pré-aqueço o forno.
Douro numa frigideira um dos lados de duas fatias do pão.  Na parte macia espalho um pouco de mostarda Dijon e uma colherada do molho bechamel re-aquecido e corrigido com sal  (se estiver muito grosso, aqueço-o com um pouco de leite ).  Sobreponho as fatias de presunto Parma e Gruyere. Fecho o senhor crocante.
No refratário que será finalizado, rego o sanduíche com uma generosa camada de bechamel e  gruyere ralado . Forno. Deixo em temperatura alta ate o queijo derreter  e virar uma dourada e delicada camada crocante. Voilà!

No prato, sirvo o Croque-monsieur ladeado por  salada de folhas temperadas com azeite, um bom vinagre e pimenta-preta moída na hora. As crianças o preferem também com batatas fritas, nós, meninos velhos, compartilhamos.

Para harmonizar uma boa cerveja de trigo – só para os meninos velhos.

Inté!

terça-feira, 5 de julho de 2016

SAL - Intensificador de sabores


Tempos atrás li num livro de gastronomia que a coisa mais importante que um cozinheiro deve saber é temperar. Sal e pimenta, conclui. Na verdade sal, corrige. A coisa mais importante que precisa saber é salgar a comida, finaliza o autor.

Essa afirmação se intensificou a medida que continuei explorando a arte culinária. E, acreditem, dominar essa técnica é verdadeiramente fundamental dentro de uma cozinha. Não a toa salgar o alimento seja uma das primeiras lições ensinadas nas escolas de gastronomia.

O sal é um ingrediente extraordinário, um intensificador de sabores, talvez o conservante mais poderoso que existe. Usado sabiamente preserva e aperfeiçoa o gosto e a textura de carnes e vegetais.

Preparado pela terra há  bilhões de anos - antes de os primeiros seres humanos aprenderem a temperar com ele seus alimentos - o cloreto de sódio é um mineral simples, inorgânico: não vem de animais, nem de vegetais, nem de microrganismos, mas do mar e, em última análise, das rochas que, erodidas, alimentaram-no com suas partículas. Trata-se de um nutriente essencial, de uma substância química sem a qual nosso corpo não vive. Nos alimentos, além de conserva-los, o sal intensifica ou melhora os sabores. Reforça a impressão dos aromas que acompanham a comida e suprime a sensação de amargor.

Não admira que, desde tempos imemoriais, as pessoas o tenham considerado indispensável. Não admira tampouco que seu nome esteja presente em numerosas palavras e expressões de uso cotidiano ( salário, da pratica romana de pagar os soldados com sal; sal da terra; sem sal) e que tenha sido objeto de monopólios governamentais, de tributos lançados pelo Estado, e de revoltas populares contra eles, desde a França revolucionária até a lendária caminhada de Gandhi rumo ao povoado litorâneo de Dandi, em 1930.

Usado em todo tipo de prato, de salgados a doces, em proteínas, vegetais e grãos, um dos poucos preceitos quando se usa sal é: use sal marinho ou algum outro especial, se quiser. Nunca use sal iodado ( a deficiência de iodo não é mais um problema). Salgue cedo, no processo de preparo, quer esteja temperando uma carne, quer uma sopa. Prove sua comida constantemente durante o cozimento e tempere adequadamente enquanto avança. "Temperar enquanto avançamos", é assim que aprendemos.


Não raro vejo jovens cozinheiros - que acham a principal função do sal é estar na mesa dentro de saleiros de porcelanas - "salgarem" a água do macarrão pondo uma pequena pitada numa gigantesca panela de água. Não sei que efeito pensam que isso terá  - se dedicassem um pequeno tempo de consideração, concluiriam não haver absolutamente efeito algum. A água do macarrão deve ter gosto de uma sopa temperada. Isso garantirá uma massa perfeitamente temperada. O mesmo vale para o arroz, sopas e a maioria dos preparados.

Salgar a comida no início ou durante o cozimento tem gosto diferente daquela salgada antes de ser servida. A primeira parece temperada; a segunda, salgada. Você não quer sentir o gosto de sal no alimento - isso significa que ele está salgado demais. Você quer senti-lo temperado,isto é, que tenha uma intensidade apropriada de sabor e equilíbrio, que não seja insosso ou insípido.

Enfim, difícil imaginar o mundo da gastronomia sem esse ouro branco. Uma coisa talvez é certa: sem ele, a comida teria bem menos graça. Seria assim...meio "sem sal".

sábado, 25 de junho de 2016

COGNAC!...

"Que poeta que sou com teu auxílio!  Somente um trago teu m’inspira um verso;  O copo cheio o mais sonoro canto;  Todo o frasco um poema!"



De caráter nobre, quase aristocrático, o Cognac  tem sua imagem associada ao bom viver e à sofisticação do  gosto. Diz-se que, quando se adquire uma garrafa de um bom Cognac, não se compra uma bebida, mas um momento único. Machado de Assis o chama de "inspirador de ledos sonhos", de "excitante licor de amor ardente", e afirma "valer mais um trago teu que mil grandezas".
O clichê do Cognac apreciado numa noite fria em frente à lareira, acompanhado de charutos, continua valendo. A lareira é opcional (ou é o próprio Cognac) e atrás dos charutos não estão mais apenas homens. As mulheres tem aderido ao Cognac da mesma forma que adotaram os charutos, escolhendo os de paladar mais delicado.

Chamado por Victor Hugo de "elixir dos deuses", o cognac, desde 1909, só pode usar o termo em seus rótulos se feito com uvas Ugni-blancs cultivadas, fermentadas e destiladas na região de Cognac, na França, em alambiques de cobre e envelhecido em barris de carvalho. Fora dessa região, qualquer destilado de vinho envelhecido em madeira é chamado de brandy.  Assim, todo Cognac é um brandy mas nem todo brandy é um Cognac. Entendeu? Continuemos.

Sua origem parece ter se dado na França, por volta do século XII, quando navios holandeses e ingleses, carregados de sal, começaram a encher as embarcações com vinhos para a viagem de volta. Esses vinhos, de vida curta, não aguentavam o longo período em alto mar e estragavam no meio do caminho. Concluiu-se que antes de embarcar, melhor seria destilar o produto para, depois, já em seu destino, diluí-lo em água e, acreditavam, recriar o vinho. Com a destilação, o volume de carga diminuiu consideravelmente e aumentou sua durabilidade. Porém,guardado em barris de carvalho para seguir viagem, notou-se que a bebida melhorava ao paladar, tornando-se agradável para ser bebida pura. Temos assim os primeiros barris do, ainda primitivo, Cognac.

Ainda no século XII, o Cognac foi melhorado após a descoberta da destilação dupla. Conta a lenda, - eu gosto mais dessa versão, mais romantizada, menos complicada -, que o segredo da dupla destilação foi revelado pelo cavaleiro Jacques de la Croix-Maron, durante um pesadelo: Satanás, desejando a alma do Cognac, tentou fervê-lo sem sucesso. Quando o demônio ameaçou fervê-lo novamente, o cavaleiro acordou repentinamente e convenceu-se de que, destilando seu vinho pela segunda vez, a qualidade da aguardente melhoraria em relação a primeira ebulição. Assim fez, e assim constatou.

Histórias à parte, depois de destilado, o eau de vie  precisa passar vários anos, às vezes décadas, guardado em barris de carvalho a fim de desenvolver suas qualidades, reduzir seu teor alcoólico e adquirir sua característica cor âmbar. É também nessa fase que recebe o gosto peculiar concedido pela madeira.

Durante esse período, o Cognac perde de 3 a 4% de seu volume alcoólico, por ano. Conhecida como "a parte dos anjos" , essa  perda é necessária para a maturação do processo.

As referências quanto a idade do Cognac correspondem ao tempo que  passou envelhecendo no barril, já que na garrafa sua evolução cessa, tornando-o imortal.

Maisons reputadas costumam trabalhar com aguardentes antiquíssimas, chegando algumas a ter quase um século de hibernação. Nessas casas, blends de uvas de quarenta a 100 anos flutuam em barris de carvalho, pronunciando aromas complexos de frutas secas, bálsamos e especiarias. Tanto capricho e cuidado, lógico, tem seu preço.

Tesouro líquido - sem exagero na expressão - o  Cognac  Louis XIII Black Pearl Limited Edition, da Maison Rémy Martyn - cujo décanteur (como é chamada sua garrafa exclusiva) é minuciosamente esculpido e feito com um precioso cristal francês, com gargalo em ouro 24 quilates e tampa em formato de flor de lis -, pode chegar a custar tranquilamente  US$30.000,00.
Não atoa, os principais consumidores de Cognac finos estão nos países do Oriente Médio, onde as caríssimas  garrafas de cristal Baccarat passam de mãos em mãos de xeiques e príncipes muito abonados.

Como os franceses, prefiro degustar o Cognac aquecendo-o antes com o calor da palma da mão envolta naquele copo baixinho, bojudo. Degustadores contemporâneos dirão achar ideal bebê-lo em temperatura ambiente, usando cálices com hastes compridas. Não ligo, o importante é manter o ritual e cultivar o tempo da degustação, como os bons produtores o fazem para chegar à bebida final. A diferença é que, em vez de décadas, basta esperar alguns minutos.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

AZEITE E BOUQUET-GARNI

 Em dezembro passado uma amiga me pediu  que , assim que arranjasse tempo, preparasse alguns azeites de ervas para presentear alguns amigos. Enrolei algum tempo por conta da correria de fim de ano, férias, até que no feriado de carnaval consegui entregar o pedido. Preparar azeite de ervas e condimentos exige paciência e dedicação para se obter êxito. Necessita reservar algum tempo para procurar um bom azeite, arranjar e secar ervas frescas, especiarias...  


Uma semana antes de entregar a encomenda, apanhei nas jardineiras do restaurante, alguns galhinhos de tomilho, salsa e alecrim. No varejão comprei alho poró, folhas frescas de louro e grãos de pimentas preta e rosa.

Em casa, com exceção das pimentas, todas as ervas  foram lavadas e secas,  embrulhadas em cones feitos com folhas de jornal (iguais a temakis) e postas para secarem  penduradas dentro de um armário de madeira, longe da umidade e  claridade do sol ( para desidratarem sem perder muito da cor original), pelos próximos sete dias.

No meio tempo, fui atrás de vasilhas para guardar meu preparado. Gosto de usar  garrafas vazias de Grappa (aquele destilado de bagaços de uvas que, invariavelmente, são vendidas em charmosas garrafinhas transparentes ), por serem longas, finas e translúcidas.  Sei, alguns irão dizer, que, depois de pronto, para uma maior conservação, o ideal é um recipiente escuro para que a claridade não acelere a oxidação e estrague meu líquido precioso. Concordo. Mas, gente, duvido que, depois de provado e aprovado, o óleo aromático  ficará na garrafa tempo suficiente para uma possível deterioração. E concordemos, ficam tão lindas, as garrafas transparentes, com os condimentos mergulhados no  verde dourado do óleo extra-virgem. Garrafas arranjadas, faltava o azeite, um bom azeite.

Sobre o  azeite:
Único entre os óleos alimentares a não ser extraído , nem de um cereal nem de uma semente oleaginosa, mas de um fruto carnoso, o azeite é feito com azeitonas de seis a oito meses de idade, maduras e próximas de alcançar seu máximo teor de óleo, logo que começam a mudar de cor, de verde para roxas. Os mais apreciados, os extras virgens, não são refinados, e são resultados da primeira prensagem "a frio",  mais delicados e estáveis. Natural da região oriental do Mediterrâneo a azeitona é o pequeno fruto da oliveira, arvore extraordinariamente resistente e tolerante às secas e  capaz de sobreviver e frutificar por mais de mil anos. Hoje em dia a Itália, a França e outros países do sul da Europa são os maiores produtores e consumidores desse alimento.

Para  não camuflar e sim realçar o sabor das especiarias, preciso de um  azeite que combine com as ervas, que harmonize em intensidade.  Um extra virgem com baixa acidez, de aroma doce, rico e saboroso. Saí em busca. Encontrei azeites da Itália, da França, Espanha, Portugal. Deu vontade levar a Europa inteira pra casa. Fiquei na vontade. Somadas, aquelas garrafinhas custam uma pequena fortuna. Escolhi um excelente  extra-virgem italiano, da Umbria, frutado, intenso e com bom custo-benefício.


Uma semana depois as ervas já estavam desidratadas e, como desejei, mantiveram suas cores. Fiz pequenos  bouquets-garnis com elas. Aqueci uma pequena parte do azeite italiano. Coloquei os pequenos buquês no óleo  aquecido. Deixei em infusão por um tempo. Quando frio, retirei as ervas com cuidado para não desatarem. Distribuí o azeite da panela entre as garrafas de Grappas, já limpas, esterilizadas e secas. Com cuidado coloquei um amarrado de ervas em cada garrafa, alguns grãos de pimenta preta e rosa. Completei a garrafa com mais azeite. Vedei com uma boa rolha.  Pronto. Ficaram lindos e saborosos. A amiga ficou satisfeita.

sábado, 20 de fevereiro de 2016

BRIOCHES - De perder a cabeça



Sexta feira é dia de fornadas de brioches na micro padaria da minha casa, que carinhosamente apelidamos de petit Boulangerie - um prazer que virou um pequeno negócio.

Assados os brioches, antes de embalar e compartilhar com clientes e amigos, fazemos uma pausa pra um café reconfortante com um ou dois pãezinhos amanteigados que propositalmente sobraram - sem dono. Desenformados, ainda quentes, inundam a cozinha com seu aroma apetitoso. Fatiados, quase dispensam acompanhamento. Na boca, dissolvem provocando deliciosamente os sentidos.

Lembrei Maria Antonieta. Não por sua adoração por croissants, nem pela polemica frase atribuída a ela - "Se não tem pão, que comam brioches"  -, e que envolveu os inofensivos pãezinhos e a revolução francesa. E sim, que, por um brioche retirado do forno e posto direto à mesa do café, eu também perderia a cabeça.

O brioche faz parte da viennosserie francesa - uma extensão da Boulangerie responsável por fornadas de pães enriquecidos com manteiga e ovos,  e que recebe esse nome por ter sua origem atribuída aos padeiros vienenses. Diferente do croissant que, durante a produção, folhas de manteiga são intercaladas com a massa, resultando num pão folhado e crocante, no brioche a manteiga é integrada a massa já  trabalhada, nos cedendo um pão fofo e amanteigado de casca fina e macia.


A produção começa bem cedo, nas primeiras horas do dia. Decidido quantos brioches irão para o forno, separo e peso os ingredientes - líquidos e secos. Começo misturando a farinha (250g), o sal (4g) e o açúcar (30g). Reservo.

Noutra bacia dissolvo o fermento biológico (20g) com um pouco de leite (60g)levemente aquecido. Acrescento os ovos (2unid). Misturo.

Junto os ingredientes secos da primeira mistura. Usando as mãos incorporo tudo. Deixo descansar por 15 minutos.

Passado o tempo é hora de trabalhar a massa, posso jogá-la numa bancada ou sovar dentro da bacia. Prefiro a segunda opção. Menos sujeira. Com um mão seguro a bacia sobre a bancada, com a outra vou revirando a massa por sobre ela, com  vigor. Acrescento um pouco de farinha para não grudar muito. Controlo-me. Muita farinha a deixará pesada.  Estará pronta quando não mais grudar e estiver lisa e elástica.

Junto a manteiga (200g)
Ainda na bacia, achato  a massa e coloco sobre ela, no centro, um quadrado de manteiga com consistência ligeiramente amolecida. Fecho como se fosse  envelopar.

Sovo. Vou revirando massa e manteiga. Parece que tudo irá desandar. Precisa paciência e determinação. Continuo sovando. O braço dói. Continuo sovando. Vários minutos depois, sinto que venci. Dentro da bacia o resultado é uma bola de massa lisa, macia e brilhante. Nem sinal de pedaços de manteiga. Tudo foi incorporado.

Hora de descansar, massa e eu. A massa vai pra geladeira coberta com um pano ou tampa onde ficará durante 1:40h para a primeira fermentação. Eu vou vou pro sofá descansar e ver na televisão  qualquer coisa durante os próximos cem minutos.

O relógio desperta e me desperta. Passou o tempo. Acendo o forno e o controlo para a  temperatura de 190ºC. Na geladeira a massa cresceu e resfriou. Jogo a bola gelada na bancada enfarinhada. Divido em 3 partes e moldo 3 bolinhas. Coloco-as numa forma média de bolo inglês untada. Cubro com um pano e deixo descansando por 40 minutos - segunda e última fermentação. A massa irá crescer quase dobrar de tamanho.

Antes de levar ao forno pincelo a massa com uma mistura de gemas, água e sal. Ajudará o pão pegar uma cor.

O brioche assará em aproximadamente 40 minutos. Após meia hora, abro a porta do forno para ver a quantas anda meu pão. Todo cuidado é pouco.  Se necessário aumento ou diminuo a temperatura.

Cumprido o tempo retiro do forno e desenformo. Deixo descansando alguns minutos sobre uma grade para que a vapores não se acumulem no fundo, umedecendo em demasia.

Está pronto. Hora de perder a cabeça.

Inté!

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

CRÈME BRULÉE - Cultivando pequenos prazeres


Vou falar sobre uma sobremesa francesa tradicionalíssima que, ultimamente, caiu  no gosto dos brasileiros desbancando nosso velho conhecido - e já batido - petit-gateau.  O crème brulée é um pudinzinho de leite e ovos, finalizado com uma tentadora camada de açúcar queimado em sua superfície. Apesar de mundialmente conhecido como uma iguaria dapatisserie francesa, sua origem desde sempre rende calorosas discussões. Os espanhóis defendem com unhas e dentes a versão de que o crème bruléenada mais é do que uma variante da crema catalanha surgida no século XVII. Na terra da rainha, os ingleses juram que o creminho queimado é uma interpretação do Burnt cream. E ainda em Portugal ela recebe o nome deLeite-creme. De uma coisa ao menos concordam: todas as variações partem de uma receita base, o creme anglaise - gemas, creme de leite e açúcar. A partir daí, ela oferece infinitas possibilidades de sabor. É só deixar a criatividade voar.
crème brulée, alem de saboroso e elegante, instiga outros sentidos. O creck da colher quebrando a camada crocante de açúcar e sua cremosidade gelada são surpresas agradáveis para qualquer paladar. É alegre ver a personagem de Andrey Tauton no filme francês  "O Fabuloso Destino de Amélie Poulain" cultivando um gosto por pequenos prazeres: enfiar a mão num saco de grãos, jogar pedras no canal St. Martin e... adivinhem? Quebrar a casquinha de açúcar do crème brulée com uma colher.

Tenho uma receita que vez ou outra faço em casa. Retirei ela de um grande e pesado livro de técnicas culinárias: Chef Profissional - Instituto Americano de Culinária.
A receita é ótima e, depois de tentar outras tantas, foi a que me encheu de pequenos prazeres. Vamos fazer?
Precisaremos apenas de quatro ingredientes (creme fresco, ovos, açúcar e baunilha) para fazer uma das mais sofisticadas e elegantes sobremesas da terra de Charles de Gaulle. O processo, um pouco lento, precisa de atenção. O final, surpreendente.
Um pequeno maçarico culinário será indispensável para o gran finale, para quando for fazer o espelho de açúcar sobre o creme, quase sempre rodeado de pares de olhos curiosos.  Assim, se decidir seguir adiante você precisará ter em mãos esse brinquedinho culinário, encontrado em qualquer loja de presentes. Como diz uma poética amiga, fã do creminho queimado: o crème brulée que esqueceu de ser flambado será nutritivo, porém pouco atraente, leve e nada tentador, calmante e pouco excitante, doce mas desbotado, desfalecerá sem fazer barulho...um casamento sem desejo.
Uma última dica antes de começar: se possível faça com um dia de antecedência, pois o creme precisará estar gelado quando for fazer o caramelo na superfície, não queremos que o calor do maçarico interfira na consistência do creme.
Comece combinando 960ml de creme fresco, 115g de açúcar e uma pitada de sal. Leve essa mistura ao fogo e ferva suavemente em fogo médio, mexendo delicadamente com uma colher de pau. Retire do fogo.
Abra uma vagem de baunilha, raspe as sementes e junte a vagem e as raspas a mistura do creme fresco. Tampe e deixe em infusão por 15 minutinhos.
Leve de volta ao fogo e espere ferver.
Enquanto isso, combine 160g de gemas batidas com 25g de açúcar e coloque essa mistura  no creme quente. Coe e ponha em ramequins de 180ml, enchendo-os até 3/4 da altura.
Asse em banho-maria a 165ºC só até ficarem sólidos, isso demorará mais ou menos uns 25 minutos.
Retire os cremes do banho-maria tomando cuidado para não deixar entrar agua, seque o fundo dos ramequins. Deixe-os na geladeira até ficarem bem gelados.
Para terminar o crème brulée, coloque uma camada fina de açúcar sobre a superfície de cada creme. Use o maçarico de propano para derreter e caramelizar o açúcar. Sirva.
Ps: Depois me conte sobre aquele pequeno prazer quando quebrar a casquinha do seu crème brulée.
Inté!